domingo, abril 12

ConVento (ou a escolha de Ana)





milagre de flores num vestido branco

hábito

manchado

de sangue puro acontecer

eremita de desejos aprisionados

castos

em celibato virgem


i.n.v.o.l.u.n.t.á.r.i.o


o toque

nus cabelos dourados


coroas de rosas

sem espinhos


caminha descalça de mão dada com a dor


ermida da memória

onde o vento leva as promessas

palavras

na cor do santuário


sim, meu anjo amo-te em cascatas de notas musicais


sorris na distância dos quilómetros que não digo

fotografas monumentos que constróis em nossa honra


arquitecto de amores plurais

onde

sou singular.


As madrugadas são manhãs por acontecer.


Sorrio ao mar que me aguarda


escarpas rasgadas na descida sem retorno

danço ao som do eclipse lunar

solstício de verão a chegar


fecho os olhos, as mãos, a boca

neste caminhar

onde o meu corpo se abre em alma

para o teu entrar.




sexta-feira, fevereiro 6

I Don't Think About You Anymore But, I Don't Think About You Anyless




Abriu a carta, de olhos aguados e a pele gasta, encolheu os ombros, num estado de inquietação,  esperando a última hora.

Sumarentas marcas indeléveis em labirintos dissimulados, enroladas em destinos escritos, gemidos em vez de ser,  feitos pudores. Ou altares.

Deixou-se molhar pelos contornos de um  orvalho disforme, então fragmentos duma  serenidade ansiada, com todos os nadas inteiros, adornados na alma.


E naquela provocação, sedução, a espera era quieta, cristal infalível. 
E rendi-me, rendada.

Dói-me o coração, iluminam-se janelas num torpor imoral, a parecer poesia com aroma de cigarrilhas. 

Tenho a pele salgada de palavras desenhadas nos muros par[a]dos. Uns arrepios indiscretos, o lu[g]ar vazio.

I-m-a-g-i-n-o.

E enterro o tédio num gole de cerveja, com promessas dobradas em ladrilhos de luz néon.

Subitamente, a vida segue de mansinho.

segunda-feira, outubro 20

Sombras [reeditado]


Grisalha a febre da neve que tomba
em geada 
desgrenhada pelas noites de olheiras no corpo amachucado
violado pelas memórias invencíveis

lábios puros de aromas
de pele na pele
ácidas
as palavras

que despem o momento da partida

emoções divididas

r
e
p
a
r
t
i
d
a
s

hino ao amor entoado a cada gesto inacabado
suspenso o coração
galope apressado
beijo olvidado

lembras-me em noites que o dia não permitia

sussurras(-me) letras desordenadas

no meu peito

aberto

ao teu olhar

profundo como o mar

o (meu) amor

por inventar.



quinta-feira, agosto 14

Sombra que o sol me dá...



Descobrir a cor da dor em náuseas que contorcem o corpo por dentro entre o ventre e o peito a arder. nas mãos uma canção muda. a surdez do teu olhar no meu que é cego desde que vomitei o último orgão.

Enrolada no vómito a morrer devagar, invento borboletas de asas pretas.

Sal que o mar bebe das lágrimas que [me] secam a palidez dos dedos em anéis de alianças cruéis.

Escondo o sol nas pálpebras beijadas pelas cigarrilhas. hálito a uísque velho, mais que antigo, assim a paixão que [me] desflora gestos ávidos de uma revolução esquecida.

Jogo de cabra-cega-de onde vens, em círculos tocando o ar bafejado a perfume de sexo tirânico.

Ordenas com um beijo, que me cale. O rio sagrado transborda. E a tua voz é afrodisíaco que as putas usam com os clientes que se [te] seguem.

(desvio o sentido na direcção oposta ao obrigatório e continuo a escrita sobre ti: ''Para te sentires dono de ti, gostas das putas como se fossem amantes submissas, sem a prisão emocional de teres que corresponder a afectos...)

segunda-feira, junho 23

Oração


morreu[-se] assim, aos poucos, como que  a respirá-lo nos dias sem mácula, sem aromas nem cores num beijo de encolher de ombros

olhou-a parada, anunciada. de pálpebras abertas ao vento, como quem chora. ou reza.

viu-o desenhado nas montanhas que lhe são corpo, tão seu…
…tão longe de si própria,  na imutabilidade dos dedos pálidos, macerados pelas dores sempre virgens. 

na flor do sorriso aberto à vontade, espreitou-lhe as palavras, desenhou-se no silêncio que a morte ia emudecendo, em surdina de verbos corrompidos pela desentendimento.

o tempo inquieto a secar a boca
louca
na extravagãncia excessiva de já não o escutar. nem falar.

tão só.

desde então, bebe-O  numa oferenda de domingos castos
                                    bastos os dias finitos em que navega o verão.

quarta-feira, abril 16

25 de Abril sempre...


De encontro ao teu beijo de lábios de espanto
esquecido no fundo do corpo ao relento,
em alma de gelo, onde um pecador é santo
acende uma chama num coração cinzento.

Escondido no peito, a revolta de outrora
explode em canções e cravos de Abril
o gesto, o olhar a revolução que demora
nesta democracia encapotada, de gente vil.

E eis que num gesto, recordo o teu sangue
a ferver-me na boca de tanto o gritar,
a tentar salvar-nos deste governo infame,
a salvaguardar direitos que nos querem tirar.

Liberdade, pão, paz e dignidade,
trabalho, saúde, educação
em oportunidades, a igualdade
e 25 de Abril  sempre, no coração.


segunda-feira, abril 7

O Vestido Branco




Corpo dourado, bamboleante, firme nos passos e nos pensamentos por adivinhar, enquanto caminha etérea, vaporosa e livre. Cintilante.



Uma frescura que emana do sorriso rubro. Assim as faces, pelos olhares que desperta. Olhares elogiosos vadios de desejo. Olhares de volúpia ansiada. Olhares de ver para lá do vestido branco. O corpo liberto de tudo, num despudor natural de alma renascida. O peito empinado num desafio constante.



Assim o vento que lhe toca os ombros nus numa transparência esvoaçante.
Pernas ágeis, torneadas pelo vestido rodado e solto.



Os cabelos da cor da pele, tingidos pelo mar de Sol em toques quentes de salpicos salgados , amorangados pelos beijos calientes de um Verão sem memórias.



(E é doce a espuma das maçãs que lhe despertam os sentidos. E é inebriante o perfume da música que lhe toca alma. E são suaves as mãos que a despem do vestido branco, num só gesto de despojo de noites de encantar.)



Então, deixa que o corpo se movimente nos ritmos que sabe de cor, mesmo os inventados em cada momento único, assim o homem que a veste de carícias nas madrugadas que são tardes todas as noites.



Mesmo em noites em que a Lua deixou de ser Cheia, iniciando a fase seguinte até o ciclo se completar.