terça-feira, março 9

One More Second

 

Foto: CM

Viajo anónima

na incerteza dos nossos olhares insuspeitos, 

canto, como que afogada em lágrimas

e desfaleço

faminta

da eternidade nas minhas mãos em concha na definitiva espera do teu corpo,

da ausência da alma 

nesta intrínseca urgência

que me tinge o olhar de um azul inventado,

como se fosse fácil

guardar o tormento do estridente som do silêncio.


sexta-feira, outubro 23

Calling Out





 


Esta fome sem nome (sede?)

onde te canto (conto?)

em encontros imaginários ,

de afagos e(m) sonho

e o meu corpo findável (suportado apenas por tanta paixão na alma)

a minha mão  a acenar-te, ao balcão do Cave

a minha face lívida, a  tentar acordar-te para uma última dança

num desassossego daquela especial música rock, alternativa, independentemente do momento

sempre a surpreender

(mas somente silêncio
ao cair de todas as tardes que se tornavam noites).

Pergunto-te: mais um copo?

Ignoras-me num desvio cobarde de olhar

Como se nunca tivéssemos sido

Mesmo quando assolados pela inquietude serena

De batimentos cardíacos em uníssono


Nada mais a dizer(-te)

Já não me importa que não venhas

o tempo apenas é (um enquadramento) 


sei que um dia, sentirás a minha falta

pois a partida está para breve

talvez então entendas

o fulgor do meu rosto escarlate apesar da palidez do meu corpo

sem vida

sem música

sem sangue. Sem gritar.


sábado, outubro 3

You'll Follow Me Down

 



Rendeu-se ao aroma homogêneo dos antissépticos. 

E no silêncio metálico da solidão, o prenúncio da falta de ar.

Precisa respirar o sol, mas só consegue absorver a ferrugem do luar de agosto. E já em outubro, esperando milagres. A própria imagem esbatida, desfocada no espelho.

A pele da alma é indescritivelmente doce. O corpo ascende ao céu.


Dor nos lábios, de tanto os fechar para não gritar.


quarta-feira, setembro 23

In the Capital

 

Perdeu a fome, esqueceu a sede e imagina apenas a boca dele a sorrir.

De saudade? 

Todos os dias, de olhos rasgados pelas feridas que não cicatrizam, se 

esvai em sangue, o corpo  dobrado em  náuseas violentas, dores internas vomitadas, num 

início  de viagem que a  transporta para outro universo. 

É de chumbo, a falsa sensação de leveza. A inconstância  dos passos levou-a até lá, ao lugar dos olhos húmidos, deixando-a ficar adormecida nas  memórias dos abraços. 

Tanto tempo. Tanto. E nem mesmo assim, tentou secar os olhos dela com as suas mãos de abandono de despedidas disfarçadas.

Naquele fim de tarde, ela finalmente  chorou, afAgando-o numa incerta precisão. 

Ficaram alguns minutos naquele contacto  visual, a trincar os cubos de gelo, mas era mais o vidro fino  do copo que ela sentia a entrar-lhe na boca, do que o líquido.

 Toco-te. 

Seiva arrepiada no toque das palavras. 

EU disse FICAAcho que TU não ouviste. 


Ficámos a tomar a nossa cerveja. Estupidamente gelada.

E mais nada. Nunca mais.



.

 

quarta-feira, junho 17

Victims over Victors




Diz!

E tu pedes-me silêncio. (Numa profanação das minhas saudades imensuráveis, quase dolorosas).

Espero-te.

Adivinho-te a chegar, com esta minha imaginação poderosa, que (me) torna  dormente, a mente.

Preciso de não te esquecer. Areias movediças, corpos ondulantes, sôfregos, perigosamente perto.

A pele é íman.

Vejo-te prismado em mim, a aniquilação é inevitável.

Sei o que quero. Caminho nas escolhas, passos que imagino nas areias do meu deserto,  e que me são oásis.

Calçar ou calcar a dor? Não a esmago, aprendo-a. Enfrento-a na liberdade de caminhar no sentido oposto.

E sou livre.

sábado, fevereiro 22

La Décadanse






e naquele dia o teu olhar foi o princípio do (a)mar desenfreado, em constantes encontros que eram sempre breves. ausência vítrea na capela isolada. corpos vestidos de desejos nus. almas cúmplices de olhares que beijam. fugazes. fugidios. audazes. por vezes incapazes. eutanásia cega de sentidos. morri de pé como os soldados cegos, enganados pela vitória que se misturava com o gás nas trincheiras.

trazes nos cabelos, o vento da minha liberdade inquieta. eco de gritos surdos ou agudos, já nem me lembro bem. apenas te sei devoluto. presente abandonado. não me vês, porque não me olhas. (sor)rio ondulante de secura extrema. árvore tombada de raiz nua. sou ave presa. sou pressa, sou poema que escreveste, na véspera daquele dia.

quinta-feira, outubro 31

Do you remember me?




Voltei a escrever sobre mim, nos cadernos antigos, de capa preta que guardava em lugares ocultos, e quase me comovo, por não reconhecer depois, a minha letra.


O vento que faz esvoaçar as folhas, traz um aroma a baunilha e os beijos que lá guardo, de sabores vários, imperceptíveis a todos os palatos, excepto ao meu. 

Dos teus lábios perfumados, tatuados na minha pele.

Quando me deixava morder ao de leve, sentindo-te. 

S a b e n d o - t e.

Degustando-te poro a poro, num envolvimento de almas nos corpos invisíveis.

Engolir-te em rajadas respiradas num sufoco de quase dor.

Toco-te

E trago comigo todos os aromas, sabores e cores que já foram.

quarta-feira, setembro 12

Saudade leva-me contigo




Amor inquietante no naufrágio dos dias.
Habito ainda, o coração dos pássaros que esvoaçam no teu peito.
Tardes inexoráveis de dedos imaculados, e que ainda me tocam os ombros nus.
Respiro(-te) o hálito, sorvo-te o beijo, absorvo-te inteiro.
Esqueço-me, lembro-te, nas horas breves de todos os dias.

Descanso nas memórias, e afugento a tristeza, com um gesto pálido de indiferença.

quinta-feira, abril 28

Pedra da Lua










em Dezembro

as chamas dos olhares gelaram

de fogo insano

as mãos dadas nos caminhos que jurámos percorrer


corpo a corpo de pele na pele


almas que vivem em suspenso nas tríades


notas soltas nos corações desabrigados dum Inverno inconsequente



invento-te em amores ilícitos


paixões eternas que duram enquanto a memória permanece

impura
a neve
do meu d.e.sc.o.n.t.e.n.t.a.m.e.n.t.o

morte anunciada no preludio duma lágrima

vida afugentada pelo sorriso do indigente

ardente a carne viva em primaveras de azul

amo-te quando te esqueço

a
p
a
i
x
o
n
a
d
a
m
e
n
t
e


enfraqueço a fragilidade dos espelhos


que já não (me) reflectem

ouso palavras


gestos r.e.p.e.t.i.d.o.s


afundo-me na terra

e

sou raíz.

sábado, abril 2

Someone (exactly) Like You,


Não sei. Não sei como vou viver sem ti. Mais órfã que viúva, porque não morreste, nem nunca morrerás primeiro que eu. Não sei se sabes deste amor que não sabe ser.

Não sei quantas lágrimas aguento, não sei quantos beijos não te dei.
Não sei, não sei.

Abro a porta da igreja e desafio a obediência, de olhos vendados. A lembrar dias que não tivemos. Ensopados de história. E estórias. Tanto de muito.

E dizes-me que o importante é eu sentir-me bem. Sentirei, quando deixar de (te) sentir... 
...A primavera que tarda no teu olhar de música. 

Quando parti para o deserto, disseste-me… O que foi mesmo que escreveste? Devo ter guardado algures, nesse tempo nem imaginava que não eras de poemas e ainda hoje não sei se é um excerto, ou se era já a tua alma a tocar a minha. Não sei.


Desejava que ele a beijasse. E ela, de olhos abertos a ver o beijo…
… mas antes, de olhos nos olhos.

Depois de olhos fechados, na imaginação em que os beijos existem e na intensidade  que se adivinham todos aqueles que ainda não foram dados.


Se me amas[te]?

Não sei, não sei...

sábado, dezembro 26

Esqueço-me de respirar cada vez que me beijas



abro esse dia. na vontade de esquecer a distância.
descalço os teus passos a caminho do lodo. nesse caminho em que a lâmina te trespassou o peito de verde pinho. feito ninho. de aves loucas, opacas de sal. mar que me faz onda a rebentar aos teus pés de amo. senhor. espanto [a dor]. sempre te reconheci pelo reflexo de lua. cheia. apneia. encantado o tempo das romãs mais-doces-que-as-maçãs-que-me-descascavas.

meu olhar de lava.
lava o meu olhar.
lava 
leva.
abro os olhos.    
e____________________ fechas a memória da noite com os meus pulsos em sangue___________________ nas tuas mão de príncipe. 



domingo, abril 12

ConVento (ou a escolha de Ana)





milagre de flores num vestido branco

hábito

manchado

de sangue puro acontecer

eremita de desejos aprisionados

castos

em celibato virgem


i.n.v.o.l.u.n.t.á.r.i.o


o toque

nus cabelos dourados


coroas de rosas

sem espinhos


caminha descalça de mão dada com a dor


ermida da memória

onde o vento leva as promessas

palavras

na cor do santuário


sim, meu anjo amo-te em cascatas de notas musicais


sorris na distância dos quilómetros que não digo

fotografas monumentos que constróis em nossa honra


arquitecto de amores plurais

onde

sou singular.


As madrugadas são manhãs por acontecer.


Sorrio ao mar que me aguarda


escarpas rasgadas na descida sem retorno

danço ao som do eclipse lunar

solstício de verão a chegar


fecho os olhos, as mãos, a boca

neste caminhar

onde o meu corpo se abre em alma

para o teu entrar.




sexta-feira, fevereiro 6

I Don't Think About You Anymore But, I Don't Think About You Anyless




Abriu a carta, de olhos aguados e a pele gasta, encolheu os ombros, num estado de inquietação,  esperando a última hora.

Sumarentas marcas indeléveis em labirintos dissimulados, enroladas em destinos escritos, gemidos em vez de ser,  feitos pudores. Ou altares.

Deixou-se molhar pelos contornos de um  orvalho disforme, então fragmentos duma  serenidade ansiada, com todos os nadas inteiros, adornados na alma.


E naquela provocação, sedução, a espera era quieta, cristal infalível. 
E rendi-me, rendada.

Dói-me o coração, iluminam-se janelas num torpor imoral, a parecer poesia com aroma de cigarrilhas. 

Tenho a pele salgada de palavras desenhadas nos muros par[a]dos. Uns arrepios indiscretos, o lu[g]ar vazio.

I-m-a-g-i-n-o.

E enterro o tédio num gole de cerveja, com promessas dobradas em ladrilhos de luz néon.

Subitamente, a vida segue de mansinho.

segunda-feira, outubro 20

Sombras [reeditado]


Grisalha a febre da neve que tomba
em geada 
desgrenhada pelas noites de olheiras no corpo amachucado
violado pelas memórias invencíveis

lábios puros de aromas
de pele na pele
ácidas
as palavras

que despem o momento da partida

emoções divididas

r
e
p
a
r
t
i
d
a
s

hino ao amor entoado a cada gesto inacabado
suspenso o coração
galope apressado
beijo olvidado

lembras-me em noites que o dia não permitia

sussurras(-me) letras desordenadas

no meu peito

aberto

ao teu olhar

profundo como o mar

o (meu) amor

por inventar.



quinta-feira, agosto 14

Sombra que o sol me dá...



Descobrir a cor da dor em náuseas que contorcem o corpo por dentro entre o ventre e o peito a arder. nas mãos uma canção muda. a surdez do teu olhar no meu que é cego desde que vomitei o último orgão.

Enrolada no vómito a morrer devagar, invento borboletas de asas pretas.

Sal que o mar bebe das lágrimas que [me] secam a palidez dos dedos em anéis de alianças cruéis.

Escondo o sol nas pálpebras beijadas pelas cigarrilhas. hálito a uísque velho, mais que antigo, assim a paixão que [me] desflora gestos ávidos de uma revolução esquecida.

Jogo de cabra-cega-de onde vens, em círculos tocando o ar bafejado a perfume de sexo tirânico.

Ordenas com um beijo, que me cale. O rio sagrado transborda. E a tua voz é afrodisíaco que as putas usam com os clientes que se [te] seguem.

(desvio o sentido na direcção oposta ao obrigatório e continuo a escrita sobre ti: ''Para te sentires dono de ti, gostas das putas como se fossem amantes submissas, sem a prisão emocional de teres que corresponder a afectos...)

segunda-feira, junho 23

Oração


morreu[-se] assim, aos poucos, como que  a respirá-lo nos dias sem mácula, sem aromas nem cores num beijo de encolher de ombros

olhou-a parada, anunciada. de pálpebras abertas ao vento, como quem chora. ou reza.

viu-o desenhado nas montanhas que lhe são corpo, tão seu…
…tão longe de si própria,  na imutabilidade dos dedos pálidos, macerados pelas dores sempre virgens. 

na flor do sorriso aberto à vontade, espreitou-lhe as palavras, desenhou-se no silêncio que a morte ia emudecendo, em surdina de verbos corrompidos pela desentendimento.

o tempo inquieto a secar a boca
louca
na extravagãncia excessiva de já não o escutar. nem falar.

tão só.

desde então, bebe-O  numa oferenda de domingos castos
                                    bastos os dias finitos em que navega o verão.

quarta-feira, abril 16

25 de Abril sempre...


De encontro ao teu beijo de lábios de espanto
esquecido no fundo do corpo ao relento,
em alma de gelo, onde um pecador é santo
acende uma chama num coração cinzento.

Escondido no peito, a revolta de outrora
explode em canções e cravos de Abril
o gesto, o olhar a revolução que demora
nesta democracia encapotada, de gente vil.

E eis que num gesto, recordo o teu sangue
a ferver-me na boca de tanto o gritar,
a tentar salvar-nos deste governo infame,
a salvaguardar direitos que nos querem tirar.

Liberdade, pão, paz e dignidade,
trabalho, saúde, educação
em oportunidades, a igualdade
e 25 de Abril  sempre, no coração.