Despertei com as palavras a sufocarem-me o olhar. Como acontece de cada vez que te lembro com mais intensidade. Porque sabes bem, que estás sempre comigo, sinto-te a presença e a protecção constante. E a maior dor é a falta do teu abraço, do teu contacto, do teu aroma a lilases silvestres (chegaste a saber que se tornaram as minhas flores preferidas?). A falta do teu olhar doce e um pouco triste (a tua neta herdou esse olhar). Mas o que mais falta me faz é o teu sorriso, esse sorriso que te vinha da alma, o sorriso que tinhas até quando te apetecia chorar. Esse sorriso de um amor imensurável e incondicional. Essa capacidade de amar que te tornou numa mulher admirável e inesquecível por todos os que te conheciam. Não sei de ninguém que não te adorasse. Até o pai, homem rígido e difícil na forma como manifesta as emoções, ainda te lembra como A Mulher, única e insubstituível, apesar das tentativas, porque não sabe viver sozinho.
E és única.
Fui ao baú onde guardo alguns dos teus pertences: as cartas que me escrevias, quando eu ia de férias para a tua aldeia, os postais, os recados que me deixavas de manhã, quando ias trabalhar, os postais que te escrevia no Dia da Mãe, o teu relógio, as tuas jóias, entre tantas outras coisas que intensificam a tua presença, em mim, comigo.
No mesmo baú, guardo os cadernos onde me tentei libertar em palavras, todas as tentativas de poemas que te escrevi.
Porque gostavas de me ler, continuo a escrever...
E hoje, mais um dia em que as lágrimas deslizam rápidas e quentes. Não pela tua memória, mas por não estares aqui. Por tudo o que não fizeste. Pelo teu sofrimento tão imerecido. Pela vontade inexpugnável que tinhas, de viver. Pela tua partida precoce, embora anunciada. Pela dor e raiva com que fiquei, por me teres deixado assim...
Pois nem imaginas o que levaste de mim, quando partiste.
Daqui a pouco, num tributo à importância que davas aos simbolismos, às tradições, vou-te visitar ao local, onde repousam os teus ossos, o que resta de ti em matéria. E, tentar encontrar a tua flor preferida, a açucena branca.Tem sido difícil, mas eu vou tentando.
Sempre que a minha (má) gestão do tempo me permitir, voltarei a este espaço, que vou construindo, de memórias.
Apenas porque há memórias que são mais do que isso. E porque sabes que, para mim, recordar não é viver (lembras-te das nossas discussões? De como ficavas assustada com os meus argumentos e a minha intempestiva rebeldia?). Pois recordar é apenas, existir. As memórias são importantes, fundamentais até, no nosso percurso de vida. Desde que não nos prendam ao passado, e nos deixem continuar a viagem das descobertas. De nós e dos outros.
Um beijo e até já. Vou à procura da tua flor. E esconder as lágrimas da minha família, que me conhece sempre alegre.
Nota: A tua neta, num gesto de puro amor por alguém que só conhece de fotografias e de conversas, fez uma tatuagem com a tua flor preferida.
9 comentários:
Espero que encontres a tua açucena branca!
(Deixo aqui algumas palavras que me confortam, na esperanca de que tenham o mesmo efeito em ti...)
"I still hear the songs, I still see the lights
I still feel your love, on cold wintery nights
I still share your hopes, and all of your cares
I'll even remind you, to please say your prayers
I just want to tell you, you still make me pround
you stand head and shoulders, above all the crowd (...)"
esta é a minha ladainha natalicia, a que recito para chamar o sorriso na noite da consoada.
Com carinho, Iveta
Ana! Deixo-te um beijo cheio de emoção e lágrimas incontidas, pelo belo texto de AMOR dedicado á MULHER que te deu o SER. Também eu trago o mais belo SER, a minha MÃE dentro da ALMA! Acompanha-me sempre...e vejo-a sorrir para mim em todos os momentos da minha vida!Herdei dela o que de melhor tenho...o gosto pela música...pelas flores,pelas crianças...e pelo azul do céu que me acompanha sempre! Para ti amiga um dia muito feliz...em azul...sempre!
Mais uma ano em que não encontrei açucenas á venda. Bem sei que tenho que ir roubá-las aos campos, mas...olhem comprei gladíolos brancos, porque também não encontrei lírios.
Obrigada pelo vosso carinho.
Iveta, essa oração, confortou-me.
Wahine, a sms que me enviaste, deixou-me muito emocionada.
Mil e um beijos.
porque não plantas a tua açucena? podes cuidar dela com carinho até que a flor nasça, vê-la crescer e abrir, pensando sempre que aquela flor pertence á tua mãe, uma espécie de legado!
foi o que fiz no meu pequeno jardim, plantei uma flor qd o meu querido pai adoptivo faleceu, plantei-a pq estava longe quando ele nos deixou e não queria ficar assim, de mãos vazias sem nada mais para cuidar...
mesmo coberta de neve sei que lá está, e nesta altura do ano comeca a ficar verde, as folhas crescem, todos os dias a olho, está a ficar linda, é sempre a mais bonita, porque é a flor que mais amo!
no meu caso é uma hortênsia azul/lilás.
beijinho grande!
Olá Ana,
1º agradeço o teu comentário.
2º palavras muito bonitas, mãe só há uma.
Gostei do teu blog, layout que faz as minhas preferências (preto) e tudo muito arrumadinho e um "about me" q.b
Tudo de bom e certamente irei voltar.
É tempo de simulares a ressurreição
ergue-te da eternidade dos astros
escava nas veias três dias mortas
o sonho
e no fundo do espelho respira alegria
sobre o rosto escuro como um mingrólio
acende-te
na humanidade sonolenta das mãos
finge a vida
mesmo que permaneças morto
bebe
a perene memória das imagens
levanta-te de mim lázaro
como se fosses água ainda turva
sublima-te com o delicado fulgor da respiração
e não regresses mais à desolação de terra
nem ao contínuo movimento falso
do coração
(Al Berto)
Vou-te descobrir a semente da amarilis. Nunca mais te vão faltar, assim elas possam amparar, quem sabe até minimizar, tanta dor.
Bj.
Ana. Deixo-te aqui a minha mensagem...
Hoje é o dia dedicado ao Amor incondicional. A ti e a tudo o que representas na forma mais bela de amar,desejo um dia cheio de luz e cor. Que esta doce palavra seja aquela que em azul se perpétue na levesa dos sentidos...Porque MÃE é para a eternidade. Parabéns. Beijo azul.
Para sempre
Por que Deus permite que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite, é tempo sem hora, luz que não apaga
quando sopra o vento e chuva desaba,
veludo escondido na pele enrugada, água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece com o que é breve e passa sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça, é eternidade.
Por que Deus se lembra- mistério profundo -de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo, baixava uma lei:
Mãe não morre nunca, mãe ficará sempre junto de seu filho
e ele, velho embora, será pequenino
feito grão de milho.
Carlos Drummond de Andrade
Jinho...
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